Grupo de Estudos do Livro “A Personalidade Limitrofe”

No dia 06/02 iniciaremos o estudo livro “A personalidade limítrofe” de Nathan Schwartz-Salant um dos poucos livros junguianos que aborda o transtorno de personalidade borderline. O objetivo do grupo é trazer a discussão aprofundada do texto assim como dialogar sobre as experiências e dificuldades dos participantes.
O grupo não tem um número definido de encontros.

Início: 06/02/23

Encontros Semanais sempre Segundas-feiras das 20 às 21:30

On-line pelo Zoom (encontro ficará gravado).
Mensalidade: 120 reais (pix ou boleto)

Inscrição: Link na bio. Após o preenchimento da inscrição o cursando receberá informações no seu email.

Mais informações: contato@cepaes.com.br ou (27) 99926-7779.

Coordenação: Fabrício Fonseca Moraes (CRP 16/1257). Psicólogo clínico junguiano graduado pela Ufes. Especialista em Psicologia Clínica e da Família pela Faculdade Saberes; especialista em Teoria e Prática Junguiana pela Universidade Veiga de Almeida; com formação em Hipnose Ericksoniana pelo Instituto Milton Erickson do Espírito Santo; e com Formação em curso em Acupuntura Clássica Chinesa pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisas Aplicadas/Faculdade Interativa de São Paulo. Diretor Clínico do CEPAES, Professor do curso da Formação em Psicoterapia Junguiana. Atua desde 2004 em consultório particular.

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Medo, controle e a adaptação

“Faremos casas de medo,
duros tijolos de medo,
medrosos caules, repuxos,
ruas só de medo e calma.

(…)

O medo, com sua física,
tanto produz: carcereiros,
edifícios, escritores,
este poema; outras vidas.”

Carlos Drummond de Andrade
In A Rosa do Povo
José Olympio, 1945

No primeiro post de 2023 eu gostaria de falar sobre três elementos que impactam nossa vida: o Medo, o controle e a adaptação. O medo é uma emoção fundamental da vida. Em seu aspecto mais basal o medo se manifesta como o fundamento de autopreservação e cautela, podendo também se manifestar na paralisia e na fuga.

Ao longo de nossa vida, crescemos com vivências de medo naturais como o medo de ficar sozinho, da escuridão, da perda/abandono, de altura que se manifestam desde a infância, outras manifestações de medo vão se construindo com o desenvolvimento do indivíduo e de acordo com cultura, como o medo da morte, medo do fracasso, medo do julgamento e rejeição.

A cultura nos oferece formas de lidar com o medo seja pela nomeação e personficação do medo – na forma de monstros, fantasmas e demônios – ou através de ações e gestos apotropaicos – bater na madeira, invocar santos, heróis ou anjos, benzer-se – que visam repelir o medo e o mal. As religiões, em última análise, são sistemas que nos protegem dos medos, nos auxiliando a enfrentar os mistérios da vida e morte.

Na medicina chinesa, o medo é associado ao movimento da água, relacionado aos rins. Essa relação não é muito clara, mas é importante entender que os rins abrigam um aspecto energético/espiritual importantíssmo que é o Shen, que pode ser traduzido como “força de vontade” ou “vondade de vida” que vem a ser o ímpeto vital que nutre as possibilidades vitais psicofísicas. O medo, em seu aspecto natural, momentâneo visa preservar a vida, mas quando em excesso ou cronificado ele afeta o fluxo da vida, ele paralisa, limita e agride o Shen, a vontade de vida – que em alguns casos poderá afetar também o orgão físico rim. Colocando em desequilibrio todo o organismo (afetando as capacidade emocional e expansiva dos Hun, associado ao fígado, gerando irritabilidade, estagnação; aumentando a preocupação e ansiedade, afeta a segurança, capacidade de autorreferência do Yi, o propósito, associado ao Baço; que vão afetar a capacidade de elaboração e coordenação da vida Shên, a mente consciente, associado ao coração.

Assim, o medo afeta o organismo/indivíduo como um todo. Com frequência, temos reações defensivas inconscientes (mecanismos de defesa) que atuam diretamente, tentando evitar a ansiedade e o medo. De nossas atividades conscientes voluntárias temos dois modos de ser ou de nos comportarmos que expressam nossa relação com o medo : o controle e a adaptação.

Quando me refiro ao controle, falo da necessidade do controle, da necessidade de organizar, de ter previsibilidade. Ou seja, a vida se torna enrijecida, contida e artificial (sem espontaneidade ou criatividade). É como se repressássemos a vida, contivéssemos seu fluxo – nos expondo tanto às secas/infertilidade (criatividade) quanto aos transbordamentos e enchentes (imprevistos). Em ambos os casos, a perda do controle é vista como uma forte ameaça à vida – como vemos nos quadros fóbico-ansiosos. Em todo caso, não conseguimos lidar com nossa história, com nossos recursos, gerando segurança para enfrentar as situações do cotidiano.

É importante entender que quando tentamos controlar o ambiente, controlar eventos futuros, controlar exaustivamente nossas reações e dos outros, estamos tentando controlar o nosso medo/insegurança projetados nessas situações. Essa necessidade de controle é o eco do medo, que também se manifesta como ansiedade.

Por outro lado, falamos da adaptação. Esta se expressa como a flexibilidade, a capacidade de acolher e mudar/responder ao que nos advém. É importante entender que, naturalmente, pode vir acompanhada de sofrimento diante ás situações da vida, contudo, não há uma negação do medo. A adaptação é um modo de atravesar as tempestades da vida. Esther Harding, importante analista junguiana da primeira geração, afirmou sobre um diálogo que teve com Jung em 1924, quando foi abordado o medo.

Disse ele: “Tenha medo do mundo, porque é grande e forte; e tema os seus demônios interiores porque são muitos e brutais; mas não tenha medo de si mesma, porque esse é o seu Eu”. Eu disse que temia abrir a porta, com receio que meus demônios saíssem e destruissem. Jung respondeu: ” Se você os encerra, também seguramente destruírão. A única maneira de delimitar o Eu é pelo experimento. Vá tão longe quanto deseja ir, e não tardará em descobrir que foi até onde suas próprias leis permitem. Se sentir medo, seja corajosa o bastante para fugir. Encontre um buraco para esconder-se, pois essa é a ação de um homem bravo, e assim fazendo você estará exercendo coragem. Em breve o impulso de covardia estará extinto e a coragem tomará o seu lugar.” Eu disse: “Mas como eu parecerei irremediavelmente instável e cambiante!” Ele replicou: “Então seja instável. Uma nova estabilidade se reafirmará. Vivemos para as outras pessoas ou para nós mesmos? Este é o lugar onde uma pessoa deve aprender a verdadeira abnegação, o altruísmo autêntico.” (HULL, McGuire, 1989, p. 43)

Esse diálogo entre Esther Harding e Jung indica o ponto essencial da adaptação, que inclui o medo, a fuga, o enfrentamento e acima de tudo a abertura a experiência. E, para isso, precisamos de uma profunda honestidade conosco, assim como reconhecimento de nossas habilidades, de nosso caminho, dos nossos erros e acertos. Nos permitindo o pulsar da vida, ora nos recolhendo, ora nos expandindo.

Na intodução do livro “O medo da Vida”, Alexander Lowen afirma

A neurose não é, em geral, definida como medo da vida, mas é exatamente isso. A pessoa neurótica tem medo de abrir seu coração ao amor, teme estender a mão para pedir ou para agredir; amedronta-a ser plenamente si mesma. Podemos explicar esses temores psicologicamente. Quando abrimos o coração ao amor, ficamos vulneráveis ao risco da mágoa; quando estendemos os braços à frente, arriscamo-nos à rejeição; quando agredimos, há a possibilidade de sermos destruídos (LOWEN, 1989, p.11).

A vida é fluxo, movimento e transformação. O medo desse fluxo gera a necessidade de controle, em grande parte, relacionada ao desconhecimento de quem somos, o distanciamento de nossas potencialidades e nossa história. Quando nos abrimos a vida nos exposmos às mudanças e naturalmente nos adaptamos – exatamente o que acontece quando entramos no mar ou mesmo numa piscina, onde pouco a pouco nosso corpo se ajusta à flutuação, ao movimento da àgua ou das ondas, não controlamos o mar, mas nos ajustamos ao fluxo respeitando nossos limites e os limites do mar.

Com esse olhar que Jung afirmou acerca da prática da psicoterapia

“O que viso é produzir algo de eficaz, é um produzir um estado psíquico, em que meu paciente comece a fazer experiências com seu ser, um ser em que nada mais é definitivo nem irremediavelmente petrificado; é produzir um estado de fluidez, de transformação e de vir a ser”(Jung, 1999, p. 43-4).

A individuação é um exercício diário de adaptação, de fluir na vida, amadurecendo e transformando-se a cada encontro – com ou sem medo.

Referencias bibliográficas

LOWEN, Alexander, O Medo da Vida, São Paulo, Summus, 1989

JUNG, A Prática da Psicoterapia,Petrópolis: Vozes, 1999.

McGUIRE, William., ; HULL, R. F. C., C.G. Jung: Entrevistas e Encontros; Ed.Cultrix, São Paulo, 1982.

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Fabricio Fonseca Moraes (CRP 16/1257)

Psicólogo Clínico Junguiano, Supervisor Clínico, Especialista em Teoria e Prática Junguiana(UVA/RJ), Especialista em Psicologia Clínica e da Família (Saberes, ES). Pós-graduando em Acupuntura Clássica Chinesa (IBEPA/FAISP). Formação em Hipnose Ericksoniana. Coordenador do “Grupo Aion – Estudos Junguianos” Atua em consultório particular em Vitória desde 2003.

Contato: 27 – 99316-6985. / e-mail: fabriciomoraes@yahoo.com.br/ Twitter:@FabricioMoraes /Instagram @fabriciomoraes.psi

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Curso

O  CEPAES apresenta uma nova proposta de cursos, com o  Ciclo de Psicopatologia Junguiana, que serão cursos com curta duração e acessíveis aos interessados nesse campo. Cada curso será independente e com possibilidade de o aluno escolhe-los de acordo com o interesse e necessidade.

O primeiro curso desse ciclo é “Psicopatologia Junguiana Clínica” visando discutir os aspectos fundamentais da psicopatologia junguiana, as dificuldades para compreender essa construção e o arcabouço teórico que é indispensável para uma compreensão mais ampla dos fenômenos psicopatológicos, bem como o manejo do tratamento na clínica junguiana.

Temas abordados

– Psicopatologia junguiana – encontros e desencontros

– Contribuições das Escolas Junguianas

– O Ego – Formação e Funções.

– Símbolos e Sintomas – autorregulação integrativa da psique.

– Defesas Egóicas e do Self – autorregulação defensiva da psique

– Os complexos na clínica junguiana

–  Dinâmicas arquetípicas e funções estruturantes do ego

Carga horaria: 10h

Datas:


✅ Datas: 17, 24 e 31/01; 07/02 e 14/02/23.

✅ Horário: das 20h às 22h.

✅ O curso será online, ao vivo e os encontros acontecerão na plataforma Zoom. Os encontros serão gravados e disponibilizados por 15 dias após do término do curso.

✅ Investimento: R$ 320,00 (em até 3x no cartão de crédito)
                               (desconto para pagamentos à vista no Pix ou Boleto R$ 305,00) 
, Inscrição: Clique aqui. Após o preenchimento da inscrição o cursando receberá informações no seu email.

✅ Mais informações: contato@cepaes.com.br ou  (27) 99926-7779.

✅ Professor: Fabrício Fonseca Moraes (CRP 16/1257). Psicólogo clínico junguiano graduado pela Ufes. Especialista em Psicologia Clínica e da Família pela Faculdade Saberes; especialista em Teoria e Prática Junguiana pela Universidade Veiga de Almeida; com formação em Hipnose Ericksoniana pelo Instituto Milton Erickson do Espírito Santo; e com Formação em curso em Acupuntura Clássica Chinesa pelo Instituto Brasileiro de Ensino e Pesquisas Aplicadas/Faculdade Interativa de São Paulo. Diretor Clínico do CEPAES, Professor do curso da Formação em Psicoterapia Junguiana. Atua desde 2004 em consultório particular.

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Festas de Fim de Ano: A noite, A vigília e o Amanhecer

O final de ano é um período que inspira sentimentos ambíguos, pois em nossa cultura “compramos a ideia” de que as festas de final de ano é um tempo de luz, alegria, expansão, confraternização e renovação – como se não houvesse lugar para os sentimentos doloridos como a tristeza, saudade, culpa e sentimentos de vazio. O Natal e o Ano Novo podem ser extremamente opressivos.

Há lugar para a dor nessas datas? Sim! É curioso como perdemos o contato com os elementos fundamentais dessas festas: A noite, a vigília e o amanhecer.

A noite, com sua escuridão, é naturalmente um período de incerteza, medo, ansidade. Ao que devemos acrescentar, quando falamos do Natal, um trabalho de parto – que traz as dores do parto, a apreensão sobre a saúde da mãe e do bebê, a incerteza do tempo do parto (e de suas dores). A noite é o desconhecido sempre presente em nossa vida.

A vigilia é o atravessar a noite. É manter-se em prontidão, guardando a luz (fogo) que provê a segurança em meio às inseguranças da noite. A vigilia é o manter-se juntos, atentos na travessia da noite.

O Amanhecer é a segurança, proteção e o calor do sol. É o tranquilidade do fim do parto, com segurança da mãe e do filho. O nascer do sol da esperança e das possibilidades.

Os excessos de brilho, luz e música são formas de controlar a noite (e o que ela representa), assim como de afastar nossas trevas interiores. Mas, nem sempre isso é possível. Muitos de nós temos essa escuridão tão presente nas feridas deixadas pelas experiências vividas, e nessas

horas parece que não temos lugar nas festas.

O Natal é um análogo da noite escura da alma, em que muitos vivem alegremente na segurança de suas casas de suas festas, mantendo a luz e a esperança do novo dia. Outros vivem como a sagrada familia, sem lugar, num curral sem conforto e segurança, vivendo as dores do parto de uma nova vida. E temos aqueles que vagam desde o Oriente e ainda buscam um encontro que lhes dê sentido à vida.

Em todo caso, temos uma longa travessia da noite. O importante é guardar a esperança, como Renato Russo diz na musica, Mais uma Vez,

Mas é claro que o sol
Vai voltar amanhã
Mais uma vez, eu sei
Escuridão já vi pior
De endoidecer gente sã
Espera que o sol já vem

Espero que possamos atravessar as festas de final de ano , a noite escura da alma, com paciencia e esperança!

Boas Festas.

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Fabricio Fonseca Moraes (CRP 16/1257)

Psicólogo Clínico Junguiano, Supervisor Clínico, Especialista em Teoria e Prática Junguiana(UVA/RJ), Especialista em Psicologia Clínica e da Família (Saberes, ES). Pós-graduando em Acupuntura Clássica Chinesa (IBEPA/FAISP). Formação em Hipnose Ericksoniana. Coordenador do “Grupo Aion – Estudos Junguianos” Atua em consultório particular em Vitória desde 2003.

Contato: 27 – 99316-6985. / e-mail: fabriciomoraes@yahoo.com.br/ Twitter:@FabricioMoraes /Instagram @fabriciomoraes.psi

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Entre-Nós sobre Psicopatologia junguiana

(Texto resumo da apresentação de introdução do Entre-Nós de 03 de dezembro de 2022 on-line)

Bom dia a todos! Bem-vindos, é com muito prazer que retomamos o Entre-Nós, que foi um evento de dialogo, integração e trocas realizado pelo CEPAES entre 2017-2019, como tantos eventos foi interrompido pela pandemia de COVID-19, em 2020.

O tema escolhido para retomarmos nosso encontro é a psicopatologia junguiana. É certamente um tema muito interessante, vejo com frequência as pessoas inseguras no tange a psicopatologia junguiana e outras já me perguntaram “existe uma psicopatologia junguiana?” Minha resposta foi “uma não mas, várias. Apesar disso, não há um discurso amplamente aceito ou um consenso que acerca da psicopatologia junguiana.

Primeiro precisamos entender as dificuldades de pensarmos a psicopatologia. Acredito que duas citações de Jung podem nos ajudar a entender o ponto de vista:

A psicoterapia constitui uma visível exceção a esta regra: para ela, o diagnóstico é extremamente irrelevante, na medida em que – exceto um nome mais ou menos adequado para o estado neurótico do paciente – nada se ganha, principalmente no que diz respeito ao prognóstico e à terapia. Contrapondo-se declaradamente ao resto da medicina, em que, de um determinado diagnóstico, decorre eventualmente um tratamento específico e um prognóstico relativamente seguro, o diagnóstico de qualquer neurose psíquica significa, no máximo, que um tratamento psíquico seria recomendado. Quanto ao prognóstico, ele é extremamente independente do diagnóstico. (JUNG pratica da psi, pr 195)

[774] Eu prefiro entender as pessoas a partir de sua saúde e gostaria de libertar os doentes daquela psicologia que Freud coloca em cada página de suas obras. Não consigo ver onde Freud consegue ir além de sua própria psicologia e como poderá aliviar o doente de um sofrimento do qual o próprio médico padece. (Jung Freud e a Psicanálise, pr 774)

Com essas citações eu quero apontar duas coisas: 

1 – com essa concepção de Jung rejeita aquela postura epistemológica característica do primeira metade do século XX que enfocava na doença e no processos de adoecimento psíquico. Em especial a atitude psicanalítica de Freud. Valorizando os processos de simbolização e desenvolvimento, ou seja, o processo de individuação. Essa postura é um elemento fundamental na identidade e no etos junguiano,

2 – Essa atitude não nega ou rejeita a psicopatologia, não ignora o fato da psique também sofrer ou adoecer.  

Naturalmente, falar de psicopatologia devemos ter clareza da sombra que ela traz: como instrumento de “rotulação”; que gera massificação ou generalização da vida no adoecimento, levando a perda da individualidade e, há um viés político que historicamente estigmatiza grupos e minorias, assim como vinculação da psicopatologia com a medicalização da vida. Esses aspectos devem ser levadas em consideração para não sermos tragados por esse campo sombrio.

Em todo caso, não podemos jogar fora o bebê com água do banho, psicopatologia é uma parte importante de qualquer perspectiva psicodinâmica. Mesmo quando recebemos um paciente que busca análise por “autoconhecimento” podemos nos deparar, usando a imagem de James Hollis, como lugares sombrios da alma, nos pantanais da alma – que são por excelência lugares associados a dor e sofrimento, e por isso, à psicopatologia.

A questão é entendermos que o direcionamento de nossas leituras vai embasar a concepção de psicopatologia que temos. Uma leitura clássica, centrada em Jung a psicopatologia vai tender a uma psicopatologia centrada nos complexos, ou como Jung dizia no “diagnóstico dos complexos”, processos voltados a inflação e identificação com a psique coletiva (especialmente anima e animus), e dos símbolos associados ao processo de individuação.

A psicologia arquetípica é uma escola muito forte no Brasil, a psicopatologia pela psicologia arquetípica propõe re-imaginar o sofrimento a partir do discurso da própria alma, através da narrativas mitológicas e das artes. Não visando a um “tratamento específico”, mas o fazer da alma.

Atualmente, vemos vários grupos no Brasil adotando um referencial desenvolvimentista especialmente com a leitura de Fordham, e acredito que o livro de Kalsched “O mundo interior do Trauma” que chamou atenção para a importância da abordagem desenvolvimentista, do diálogo com a psicanálise inglesa.

 A escola desenvolvimentista enfatiza processo de desenvolvimento, isto é, a compreensão da história do individuo e as relações com o ambiente na construção da subjetividade, as defesas mobilizadas, os processos de amadurecimento/constituição do Ego, a perspectiva tende ao psicossomático, compreendendo os processos arquetípicos como imanentes/psicossomáticos associadas ao desenvolvimento, analisando as defesas, fantasias e projeções.

A escola desenvolvimentista foi muito criticada e até mesmo rechaçada em meios junguianos como sendo “psicanalítica” mas hoje essa perspectiva tem mudado muito. Vale a pena citar, como referência o trabalho de Carlos Byington que se dedicou à construção de uma modelo teórica próprio, a psicologia simbólica e que deixou importantes marcas no pensamento junguiano brasileiro.   

Mas, qual a melhor via para pensar uma psicopatologia junguana? A via que integra as abordagens, que permite uma leitura ampla e que possibilite uma reflexão ampla sobre caso do paciente. Até porque as abordagens se complementam.

Uma virtude que deve ser valorizada no pensamento junguiano foi que, apesar pesares, termos conseguido se manter integrado em meio as divergências e alinhamentos internos – ao que Samuels chamou de clássicos, arquetípicos e desenvolvimentistas. E da tensão entre formas de pensar e trabalhar produziram trabalhos importantes como os do Nathan Schwartz-salant ou do Donald Kalsched – que articulam concepções clássicas e desenvolvimentistas de forma impar.

Nesse sentido, por exemplo, na visão clássica,  temos a teoria dos complexos que muito pouco ou quase nada fala acerca do Ego, apenas indicando fatores associados à inflação, identidade e invasão dos complexos. Por outro lado, nos textos desenvolmentistas fala-se muito pouco dos complexos, contudo são brilhantes em relação a organização do ego, dos mecanismos de defesa, fixação desses mecanismos temos uma compreensão dos processos que sustentam a patologia e que podem que manifestar resistência e na transferência.

Com esse panorama eu gostaria de indicar elementos teóricos que se relacionam diretamente pensarmos ou organizar alguns fundamentos para uma psicotologia junguiana como é vista e trabalhada CEPAES

Ego – estrutura, organização e funções: A saúde psíquica depende da estrutura/organização, força/coesão do Ego para mediar a relações internas e externas.

Complexos Ideo-Afetivos: Os complexos condensam a experiência pessoal, necessárias ao ego. Os complexos agregam em si a imagem/lembrança e afetos. A experiência integral por ser potencialmente ameaçadora ao Ego. Os complexos se associam potencializando a energia do complexo central. O Complexo pode afetar o curso da consciência : ou invadindo,  ou pela intensificação das defesas do Ego, ou subjugando o ego colocando-o numa posição correspondente ao complexo em questão.

Símbolos, Sintomas Como expressão do Self : Todo símbolo é uma expressão da função integradora e da função autorreguladora do Self.

Defesas do Ego :As defesas do Ego visam manter a integridade do ego assim como manter suas funções.  Podendo se voltar tanto para objetos interiores – complexos, símbolos – quanto objetos exteriores estímulos, sensações e percepções. As defesas auxiliam a conter e compensar um ego fragilizado, às custas das funções do mesmo.

Defesas Arquetípicas do Self: São defesas primitivas, pré-egoicas notadamente percebida na infância.b São defesas ativadas diante de ameaças ao Self – ou integridade e vida – na infância diante de “sofrimentos insuportáveis” a realidade psíquica da criança, na vida adulta quando o ego não consegue suportar o se defender das situações. Atacam as vinculações internas, fragmentando a personalidade – note-se: a personalidade não necessariamente o Ego.

Dinâmicas Arquetípicas e funções estruturantes: As dinâmicas arquetípicas são formas simbólicas expressas em termos de ação, afetos e percepção que estruturaram a dinâmica do ego no dia a dia. As dinâmicas arquetípicas podem ser criativas – potencializando, estruturando e expandindo a ego – ou defensivas – que propiciam uma adaptação limitada e “segura”,  favorecendo as defesas. As dinâmicas arquetípicas expressam o nível arquetípico da experiência humana, logo, compreender as dinâmicas arquetípicas nos mitos e contos nos permite discriminar os dinamismos.

Considerando cada um desses aspectos podemos compreender tanto o processo de adoecimento e defesa, compreender os elementos que faltam ao processo de amadurecimento ou a individuação.

Um exemplo possível  a compreender a importância de ter uma visão ampla é pensarmos acerca da importância compreensão ampla seria pensar o humor depremido. Num olhar junguiano ele poderia indicar:

Relação com Self: Compensação  a atitude da consciência – a retirada da libido – associada a perda de sentido ou significado, pode anteceder a constelação de símbolos do Self.

Fragilidade do Ego: O Ego frágil não consegue elaborar símbolos, de forma a ficar enfraquecido desvitalizado. Não conseguindo sustentar suas funções.

Defesa Contra complexos: O Ego direciona sua energia ou grande parte para sustentar uma defesa obstinada com o inconsciente. Muitas vezes associado com uma identificação com a persona.

Defesa contra realidade exterior: Frente a uma realidade exterior hostil, o ego se defende alimentando fantasias narcísicas infantis (quer de impotência/onipotência).

Assim, uma simples “classificação” a partir do sintomas não é suficiente para compreender e indicar um caminho de tratamento. Devemos sempre lembrar que a psicopatologia junguiana é sempre uma psicopatologia clínica, ou seja, visando auxiliar na prática da psicoterapia.

Vou deixar algumas indicações de leitura: Psiquiatria Junguiana do Fierz, “Narcisismo e Transformação de caráter” e “Personalidade Limitrofe” ambos do Schwartz-Salant, “O Mundo interior do Trauma” do Kalsched Psychopathology: Contemporary Jungian Perspectives, ed. Por Murray Stein, Perversion: A Jungian Approach da Fiona Ross, Empty Soul do Guggenbuhl-craig, the Self and Autism do Fordham, Obessions do Basigni, Incest Fantasies and Self-Destructive Acts Bovenspien e Sidoli, Into Darkest Places do Marcus West dentre vários outras.

(Seguiu-se discussão)

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Fabricio Fonseca Moraes (CRP 16/1257)

Psicólogo Clínico Junguiano, Supervisor Clínico, Especialista em Teoria e Prática Junguiana(UVA/RJ), Especialista em Psicologia Clínica e da Família (Saberes, ES). Pós-graduando em Acupuntura Clássica Chinesa (IBEPA/FAISP). Formação em Hipnose Ericksoniana. Coordenador do “Grupo Aion – Estudos Junguianos” Atua em consultório particular em Vitória desde 2003.

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